terça-feira, 23 de novembro de 2010

Luto pelo estado do meu Estado

 Posso orientar a minha filha sobre quais sites visitar na internet, pra que não fale com estranhos e também pra quê não marque encontros com pessoas desconhecidas. Mas nunca diria pra ela que não deveria olhar pela janela do quarto aonde dormimos, DENTRO da casa na qual moramos. Até ontem isso nunca tinha me passado pela cabeça. Penso e questiono se a partir de ontem essa orientação fará parte do meu repertório de mãe. O que é isso? Aonde estamos?
Jornais, revistas, rádio e TV hoje têm diariamente a violência como pauta. Tornou-se tão comum que banalizamos o fato e vivemos com o mesmo comodismo de esperar por um ônibus por meia hora em média, com a acomodação em votar em tal candidato mesmo sabendo que é corrupto, pegar um documento na mão de um amigo para pagar na fila do banco, em fingir que dorme pra não dar lugar a alguém que com menos condições físicas que nós, em comprar ingresso na mão de cambista. É o mesmo princípio - ou a falta dele - : Respeito pelo outro! 
Todo dia sangramos um pouco e nem sempre nos damos conta. Até quando acontece algo de uma dimensão tão estúpida que não dá pra ignorar. Aí há um choque coletivo. Uma comoção intensa, só não sabemos quanto tempo vai durar.
A dor da família de Janaína Cristina Conceição, 16 anos, e Gabriela Alves Nunes, de 13 e de  Joel da Conceição Castro, de 10 anos, não tem data pra acabar, é uma tristeza sem data de validade.
Joel queria ser capoerista como o pai - que desenvolve um trabalho com meninos do Nordeste de Amaralina pra que não fiquem na rua "à mercê", o que é obrigação so Estado. Tenta proteger aquelas crianças, e não pôde proteger seu filho -. Sonhava em crescer seguindo seus passos e se empenhava pra isso, era um dos melhores alunos do grupo de capoeira. Chamava tanto atenção pelo seu empenho que foi chamado pra participar da propaganda do governo do estado convidando turista pra virem conhecer a "Bahia, terra de todos nós". Quanta ironia! 
As meninas certamente tinham seus sonhos também. Todos DIZIMADOS!

"Primeiro levaram os negros.                                     

Mas não me importei com isso.                                    
O grito, de Edvard Munch

Eu não era negro.

Em seguida levaram alguns operários.

Mas não me importei com isso.

Eu também não era operário.

Depois prenderam os miseráveis.

Mas não me importei com isso.

Porque eu não sou miserável.

Depois agarraram uns desempregados.

Mas como tenho meu emprego, também não me importei.

Agora estão me levando.

Mas já é tarde.

Como eu não me importei com ninguém.

Ninguém se importa comigo".

Bertold Brecht (1898-1956).




quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Do "abandono" (do blog ou das memórias)


Relógio - Salvador Dali
Administrar bem é uma arte! Seja uma casa, uma empresa, um trabalho...se for o Sr. Tempo, bingo!  
No século XXI dispomos de tecnologias que muitos sábios e profetas se quer sonharam. Mas que uso temos dado a cada uma delas? Têm nos servido ou nos escravizado?
Muito - senão tudo - do que criamos é pra nos facilitar a vida, pra agilizar as coisas, pra poupar TEMPO! Como temos aproveitado esta "sobra"? O que temos feito com o nosso tempo? Com o tempo que nos resta?
Sistema de conversação on line, telefone, celular, sites de relacionamento, e-mails, etc, tudo isso, a mim, denota  distância. Teoricamente não se telefona ou se envia correspondência eletrônica para alguém ao seu lado. Não há necessidade.
Não sou, absolutamente, contra esses e outros meios de comunicação - sou estudante da área - mas só vejo utilidade se estiverem ao meu favor. A favor da promoção da aproximação. Nem sempre dá pra ser física, é verdade, mas em identificação, sentimento e vontade!
Vivemos numa era de concorrência exacerbada e desleal. Milhares de pessoas marginalizadas, desempregadas ou em busca de uma colocação melhor no mercado. Mercadoria. É como somos tratados e tratamos. Laços afetivos muitas vezes reduzidos a "círculo de relações"; por falta de tempo em seu cuidado ou pela frieza exigida no capitalismo. 
A ânsia pelo possuir nos têm levado a uma rotina sobrecarregada de estudos, cursos, trabalho, horas extras onde nem sempre cabe um telefonema amigo ou conversas jogadas fora. Há quanto tempo não vê seus amigos (mesmo os melhores)? Qual a última vez que sentou pra ver aquele filme numa tarde qualquer em casa? Quando conseguiu ficar em casa "de bobeira"? Molhou - você mesmo - suas plantas? Tomou café na mesa da cozinha? Comeu sem pressa? Fez desenhos pra seu filho adivinhar? Conversou com ele no meio da noite no meio da semana sem se preocupar que horas (já) eram? Já teve a sensação de que suas memórias de infância ou até de um passado recente estão lhe escapando (talvez por isso estejamos tão obcecados com o registro em imagens, talvez por isso tantas máquinas digitais e fotos instantâneas) ?
...
Excesso de informações e de exigências. Algumas vezes para sobreviver, outras pra quê mesmo? 
...
"No final vai dar em nada. Nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada, nada do que eu pensava encontrar..."
Gilberto Gil